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RAP sobre Eusébio!

Outra maneira de dizer alegria

O Benfica veste de vermelho e branco porque essas são, segundo os seus fundadores, cores que transmitem vivacidade e alegria. Sim, o meu clube tem a alegria nos estatutos (e isso envaidece-me). Há três ou quatro anos, em Liverpool, o estádio do Everton tinha um aspecto bastante lúgubre. As bancadas estavam cheias de adeptos tristes, vestidos de cores escuras, deprimidos pelo clima da cidade em que escolheram viver e pelo facto de, uma semana antes, terem perdido por 5 a 0 no Estádio da Luz, o que mói ainda mais do que a neblina. Antes de o jogo começar, os altifalantes do estádio anunciaram que o grande Eusébio iria ao centro do relvado. E então, todos aqueles desgraçados ingleses se levantaram para aplaudir, sorrindo. Foi a única alegria que tiveram naquela noite, em que acabariam por perder outra vez, por 2 a 0. A camisola do Benfica foi feita para ser vestida por ele. Eusébio é outra maneira de dizer alegria. Eusébio é outra maneira de dizer Benfica. Não conheço façanhas maiores.

Cartilha paternal - by RAP

O leitor conhece, de certeza, o livro O Pai, de Máximo Gorki, a história da luta revolucionária de um viúvo e seu filho, na Rússia czarista. Também já se emocionou com o famoso quadro Composição em Cinza e Preto: Retrato do Pai do Artista, de James McNeill Whistler. A serenidade terna do pai, sentado na cadeira com as mãos pousadas sobre os joelhos, toca todos os que o observam. E também já terá ouvido o comovente Requiem Alemão, em particular o seu quinto andamento, que Brahms compôs em memória de seu pai. Infelizmente, nenhuma destas obras existe. Ou melhor, as obras existem mas todas prestam homenagem à mãe. O mundo borrifa-se nos pais, e a arte limita-se a reproduzir esse menosprezo. Eu tenho a capacidade admirável de tolerar bem as injustiças, desde que elas não me afectem.(...) 


(...) Já vimos como a figura do pai é desconsiderada na literatura, na pintura e na música, mas essa desconsideração estende-se também às formas de arte mais belas. O mundo da pornografia online é um instrumento indispensável para compreender o nosso tempo, e é por isso que eu o estudo com bastante frequência e minúcia. Há, na pornografia, uma categoria artística chamada MILF, acrónimo de uma ideia que, em português, traduziríamos por Mães Com as Quais Gostaria de Manter um Contacto Íntimo Extremamente Festivo. Essa categoria alberga filmes nos quais jovens rapazes e até respeitáveis senhores manifestam e concretizam o desejo que descrevi acima. No entanto, não existe a categoria simétrica FILF, uma vez que, aparentemente, os pais são completamente desprovidos de sex appeal.

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 http://visao.sapo.pt/cartilha-paternal=f737588#ixzz2XQXnDwkl

O cão comeu-me o orçamento de Estado - by RAP

Quando Vítor Gaspar justificou a queda do investimento em Portugal com a chuva, milhares de alunos do ensino secundário terão festejado. Há um número bastante limitado de boas desculpas para não fazer os trabalhos de casa, e mesmo essas, à força de serem repetidas, têm vindo a perder prestígio. O falecimento dos avós, por exemplo, só pode ser alegado, no máximo, quatro vezes - muito pouco para os 12 anos de escolaridade obrigatória, uma vez que, em média, não permite ao aluno livrar-se de mais do que um trabalho por cada três anos, o que tem sido lamentado por madraços de todos os tempos e lugares.
O aparecimento de uma nova justificação, além do mais com o alto patrocínio do ministro das Finanças, alegrou certamente jovens de todo o país. Sá Carneiro tinha sonhado com um governo, uma maioria e um Presidente, mas o tempo veio a demonstrar que um estadista verdadeiramente ambicioso deve sonhar com um governo, uma maioria, um Presidente e um Anthímio do Azevedo. As condições climáticas têm sido injustificadamente descuradas pela ciência política. Nenhum ministro, por mais hábil que seja, consegue controlar o défice com uma humidade relativa superior a 65 por cento. O desemprego não baixa se a temperatura mínima for sistematicamente inferior a 12 graus. E os juros da dívida sobem com os aguaceiros fortes de noroeste.
Ainda assim, há quem considere que a desculpa apresentada por Vítor Gaspar inaugura um novo tipo estratégia: avançar com a chuva como justificação para o fracasso é uma espécie de política molha-parvos. Mas quem tem dúvidas de que o clima influi decisivamente na governação, visite a enevoada Noruega, que por isso mesmo não passa da cepa torta, e depois compare com o espectacular desenvolvimento económico das soalheiras ilhas de Cabo Verde. Não admira que os povos tropicais se organizem com frequência para, disponibilizando um pouco da sua riqueza, ajudar os pobres países nórdicos, prejudicados pelo clima inclemente.
Faz falta, no entanto, integrar mais claramente o factor meteorológico no discurso político, em especial nas campanhas eleitorais. Terá mais credibilidade o partido cujas promessas tomarem em consideração as variáveis climáticas. "Não cortarei o 13.º mês se o anticiclone dos Açores bloquear as frentes frias", por exemplo, é uma promessa moderna.  


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http://visao.sapo.pt/o-cao-comeu-me-o-orcamento-de-estado=f736287#ixzz2WqozMLEV

Da palhaçada - RAP

É uma história que se contava no início do século XIX. Um homem vai ao médico e diz: "Doutor, estou deprimido. Preciso de ajuda." O médico concorda: "O seu caso é muito grave. Só há uma solução para si: tem de ir ver o palhaço Grimaldi." "Mas, doutor", diz o homem, "eu sou o palhaço Grimaldi". Vamos manter presente esta curiosa ocorrência, que ela ainda vai ajudar-nos a compreender, através de um palhaço do passado, as palhaçadas do presente.
Sempre que alguém o critica, Miguel Sousa Tavares acusa o crítico de querer promover-se à sua custa. Ao longo dos anos, vários especialistas em marketing têm optado por essa campanha promocional infalível que consiste em apontar críticas a MST, e ele tem-nos denunciado a todos. A estratégia dos críticos é bastante pueril: uma vez que, até hoje, nunca se descobriu uma razão válida para criticar MST, fica à vista de toda a gente que as críticas só podem fazer parte de um plano de promoção pessoal do crítico.
Esta semana, no âmbito da campanha de promoção do seu novo livro, MST deu uma entrevista em que chamou "palhaço" ao Presidente da República. MST, sendo licenciado em Direito, conhece o código penal, e sabe que insultar o PR gera, como quase tudo o que é ilegal, uma atenção mediática que é muito favorável à promoção de pessoas e bens. Na minha opinião, toda a gente deveria poder dizer o que pensa do PR, e sobretudo deveria poder dizê-lo da maneira que entendesse. Quer o fizesse nos termos de um vulgar carroceiro, numa tasca qualquer (por exemplo: "Este Presidente é mesmo um palhaço"), quer com a sofisticação subtil e a criatividade engenhosa de um escritor (por exemplo: "Este Presidente é mesmo um palhaço"). Há várias maneiras de se dizer o que se pensa, e os escritores, só porque são mais hábeis com as palavras, não deveriam ter um estatuto diferente dos que manejam o idioma de um modo mais grosseiro. Infelizmente, o código penal não concorda comigo e pune tanto carroceiros como escritores.
No próprio dia em que foi publicada a ofensa que dirigiu ao Presidente, MST deu nova entrevista corrigindo a entrevista anterior, e admitiu que se tinha excedido. Ou seja, MST criticou-se a si próprio. Ora, como todos sabemos, a única razão que pode levar alguém a criticar MST é a vontade de se promover à custa dele. Finalmente, alguém se promove à custa de MST com todo o mérito e justiça - o que nos permite reescrever a edificante história inicial. Um homem vai à agência de comunicação e diz: "Doutor, estou a promover um livro numa época em que as pessoas compram muito menos livros. Preciso de ajuda." O director da agência concorda: "O seu caso é muito grave. Só há uma solução para si: tem de criticar o Miguel Sousa Tavares." "Mas, doutor", diz o homem, "eu sou o Miguel Sousa Tavares."


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 http://visao.sapo.pt/da-palhacada=f733769#ixzz2VSeott3a

A identidade secreta do povo português - R.A.P.

Em 2002, Durão Barroso disse que Portugal estava de tanga. Entretanto, passaram 11 anos e é difícil negar que fomos perdendo cada vez mais roupa. Eu não sou crítico de moda, mas creio que estamos perante uma impossibilidade. Não é possível passar uma década a confiscar a indumentária a um povo que já está de tanga. Minto: é possível apenas em duas situações muito específicas e altamente improváveis. Se o povo em causa tiver a tanga vestida por cima do resto da roupa, pode dizer-se que está de tanga no primeiro momento, e fica apto a continuar a perder peças de vestuário antes de se achar completamente nu. Esta hipótese, a verificar-se, confirma a minha suspeita antiga de que o povo português é o Super-Homem. Tinha a tanga por cima da roupa em 2002 e foi ficando sem a capa e o fatinho de licra azul ao longo dos últimos anos. E aguentou tudo com força sobre-humana, que é a única maneira de um povo aguentar isto.
Outra hipótese: em 2002 o povo estava, de facto, de tanga, mas tinha várias tangas vestidas, umas por cima das outras. E foi perdendo tangas, ano após ano, até estar na situação em que se encontra agora - em que, se não está nu, estará, no máximo, monotanga. Nesse caso, o povo português não é o Super-Homem. É uma espécie de Tarzan multicueca. Um Tarzan que, tendo viagem marcada na Ryanair e, por não querer pagar uma quantia extra pela bagagem, levasse todas as suas tangas vestidas, por exemplo.
Seja qual for a hipótese correcta, é seguro afirmar a excepcionalidade do povo português, dadas as características admiráveis, quer do homem de aço, quer do rei dos macacos. Não ignoro que haja bons argumentos para refutar estas hipóteses. Pode dizer-se, por exemplo, que a posição em que estamos, no que à soberania diz respeito, torna muito improvável que o povo português seja, na verdade, o rei de alguma coisa, dado que temos cada vez mais dificuldade em fazer súbditos, mesmo entre os símios. Também é difícil identificar o povo português com o Super-Homem, sobretudo tendo em conta a extraordinária habilidade deste para combater o crime e a nossa absoluta incapacidade de meter bandidos na cadeia. Mas eu continuo inclinado para achar que o povo português tem uma identidade secreta oriunda do universo da ficção, na medida em que me parece, ele próprio, uma personagem fictícia: nenhum povo de carne e osso teria a capacidade de, empobrecido e desesperado como está o nosso, manter a nobreza de alma que é evidenciada quando os protestos se fazem a cantar e a rir.


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http://visao.sapo.pt/a-identidade-secreta-do-povo-portugues=f732441#ixzz2UmBNEkjV

Comente o seguinte país - by RAP


Comente o seguinte país

O Passos Coelho do passado e o Sócrates do presente têm tudo para ser excelentes comentadores. Infelizmente, o Passos Coelho do presente e o Sócrates do passado são primeiros-ministros muito maus



Portugal é (deixem-me só abrir um parêntesis para comentar este meu comentário. Sinto que estou em desvantagem, nisto de comentar. Bem sei que, todas as semanas, faço aqui comentários, mas tenho vontade de ir um pouco mais além e começar a comentar o que vou comentando. Se há quem possa fazer e depois comentar, como José Sócrates, a mim, que só comento, devia ser permitido comentar os comentários que vou fazendo. Toda a gente tem comentado coisas, em Portugal (e isto é, no fundo, um parêntesis ao parêntesis, no qual pretendo comentar o comentário que fiz ao meu primeiro comentário), embora sejam comentários de natureza diferente. Sócrates, logo para começar, vai fazer comentários, assunto que muitos comentadores já comentaram nos seus espaços de comentário. Uns comentaram favoravelmente, outros comentaram desfavoravelmente, e outros preferiram não comentar até que Sócrates comece a fazer os comentários propriamente ditos. Eu assisti a tudo isto e disse para mim: "sem comentários..." (porque em geral não gosto de dar demasiada confiança a mim mesmo), mas talvez seja altura de estruturar um comentário a todos estes comentários. Em primeiro lugar, gostaria de apontar uma curiosa simetria. O Sócrates do presente terá agora muitas oportunidades para comentar o Sócrates do passado; e o Passos Coelho do passado parece apostado em comentar o Passos Coelho do presente. Ainda esta semana se voltou a recordar um comentário antigo de Passos Coelho: "Não podemos permitir que todos aqueles que estão nas empresas privadas ou que estão no Estado fixem objectivos e não os cumpram. Sempre que se falham os objectivos, sempre que a execução do Orçamento derrapa, sempre que arranjamos buracos financeiros onde devíamos estar a criar excedentes de poupança, aquilo que se passa é que há mais pessoas que vão para o desemprego e a economia afunda-se. (...) Se nós temos um Orçamento e não o cumprimos, se dissemos que a despesa devia ser de 100 e ela foi de 300, aqueles que são responsáveis pelo resvalar da despesa também têm de ser civil e criminalmente responsáveis pelos seus actos e pelas suas acções. (...) Quem impõe tantos sacrifícios às pessoas e não cumpre, merece ou não merece ser responsabilizado civil e criminalmente pelos seus actos?" São palavras do Passos Coelho do passado, dirigidas ao Sócrates do passado, mas que poderiam aplicar-se ao Passos Coelho do presente. O Passos Coelho do passado é um comentador tão bom que comenta o Governo dos outros e o dele na mesma leva - sendo que o dele não existia ainda. Por outro lado, o Sócrates do presente poderá ser muito útil a explicar as acções do Sócrates do passado. Sobretudo aquelas que até hoje parecem pertencer ao domínio do inexplicável. Se o próprio, ainda para mais munido de um curso de filosofia, não conseguir explicá-las, ninguém consegue. O Passos Coelho do passado e o Sócrates do presente têm tudo para ser excelentes comentadores. Infelizmente, o Passos Coelho do presente e o Sócrates do passado são primeiros-ministros muito maus. O que perdemos como cidadãos, ganhamos como espectadores) muito lindo.

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Em cada esquina um banqueiro



Em cada esquina um banqueiro

O ideal seria que todos os estabelecimentos comerciais portugueses tivessem "banco" escrito no nome. Nenhum negócio iria à falência, porque o Estado acudiria a todos.


Ser dirigente de um banco bem sucedido é bom. Ser dirigente de um banco mal sucedido é ainda melhor. As mercearias falidas não são nacionalizadas e as casas de ferragens com problemas de tesouraria não se recapitalizam com dinheiro do Estado. O problema é das mercearias e das casas de ferragens. Toda a gente já percebeu a diferença entre recapitalizar-se, por um lado, e pedir emprestado porque se vive acima das suas possibilidades, por outro. O ideal seria que todos os estabelecimentos comerciais portugueses tivessem "banco" escrito no nome. Um talho chamado Banco Carnes de Ouro. Uma mercearia chamada Banco Frutas Idalina. Um restaurante chamado Banco Adega Regional O Botelho. Nenhum negócio iria à falência, porque o Estado acudiria a todos. Se falisse, pagava o País inteiro. Só por falta de visão comercial é que continua a haver empresários que ignoram esta estratégia simples mas vencedora.
O negócio da banca é duro e complexo. Trata-se de comprar dinheiro barato e vendê-lo mais caro. Pensando bem, talvez não seja assim tão complexo. Estamos a falar da comercialização de um produto que toda a gente aprecia. O risco não é muito grande. E, além disso, é um bem que não se estraga. Ninguém diz, ao levantar um cheque: "Olhe, desculpe, estas notas são da semana passada."
 Ainda assim, um número bastante elevado de banqueiros consegue reunir a mistura de talento e obstinação necessária para levar muitas destas instituições à completa ruína. Não deve ser fácil.
O jornalista Nicolau Santos fez, há dias, uma lista não exaustiva de banqueiros portugueses envolvidos em escândalos financeiros e consequentes processos judiciais. São cerca de dezena e meia. E acrescentou uma lista de bancos que o Estado português já ajudou, com avultadas injecções de capital. Contando com o BPP e o BPN, são cinco. Num país com a dimensão de Portugal, 15 banqueiros e cinco bancos parece muito. Não sei se é o suficiente para estabelecer uma regra, mas são números um tanto alarmantes. Qualquer dia, banqueiro detido passa a ser um pleonasmo. Talvez fosse bom remodelar os testes psicotécnicos na admissão de candidatos ao lugar de banqueiro. Aparentemente, saber de finanças não habilita ninguém a gerir instituições financeiras.

Cá estamos assim, em Portugal!

«Quando se diz que Portugal não é forte na produção de bens transaccionáveis, tal não é verdade. Produzimos povo muito bom (o melhor do mundo, aliás) e exportamo-lo cada vez mais. Não admira. Quem quer povo, em princípio, não se contenta com menos do que o melhor, e isso explica o apetite dos mercados internacionais pela nossa produção de gente.»
 
by Ricardo Araújo Pereira in revista Visão (11.out.2012)